A astronauta


Quando criança, transbordava em criatividade e determinação: seria astronauta. As pessoas riam. Ficava confusa: adulto tem algo de desordenado. Queria ver as estrelas de perto e a Terra de longe. Nada mais real e distante.

Vinte de julho de 1969. Sentados no sofá verde de plástico em nossa casa de praia, olhávamos atentos o chuvisco da televisão em preto e branco na hora programada. A televisão era tão pequena que o fabricante preferiu esquecer a antena. Às vezes um tapinha em cima, outro do lado, e tudo ficava mais ou menos arrumado. De minha boca nenhuma voz saía e nenhum gesto fazia. Sentia-me impotente à espera de ver meu sonho projetado naquele quadrado: seria tudo aquilo de verdade? Lógico! Só adulto pensaria o contrário.

De repente o esperado: Apollo 11 desceu com suas garras afiadas fincando magia na Lua. Na Lua! Naquele instante não se fazia mais necessário o ar para viver, somente meus olhos para ver. Parecia um filme de ficção na televisão que chovia e eu em total estado de paralisia. A porta se abriu e dela saiu Neil Armstrong com seus pés quadrados, deixando os meus completamente chatos.

“Este é o pequeno passo para o homem, mas um salto gigantesco para a humanidade.” Havia decorado àquela frase maravilhosa ou fora apenas um arroubo de inspiração alucinado? Não importava. Meu coração entrou em órbita. Meus olhos, de tanto olhar, imaginar e não piscar, secaram. Armstrong pulava como um coelho da Páscoa, um bêbado apaixonado e eu ali, fixa em uma terra com tudo grudado pela física, enquanto que minha cabeça fazia o caminho inverso da maçã de Newton.

Foi fincada uma bandeira. Ô, ô, por essa eu não esperava - pensei acanhada. Vamos com calma Sr Astronauta, pois a Lua não tem dono e nem dono de nada somos.

Foi um dia anormal: o homem pisara na lua. Na lua! Olhei-a mais tarde: ainda estariam por lá? Seria o mesmo horário? Minha convicção aumentava. Meu futuro estava na lá no alto, em Armstrong, em outras galáxias, e em tudo que havia visto dentro daquela televisão que chorava.

Levantei emocionada. Era muita realização pessoal sendo transferida para o corpo daquele astronauta com sua espaçonave de metal. Fui até à janela e olhei o céu: meu Deus, Jesus Cristinho, feiticeira Samantha, Gine - você que é um gênio - me dêem a chance da transformação mental, àquela que me transformará em alguém espacial!


Os anos se passaram sem que eu soubesse por onde realizar meu sonho acalentado. A vida me apontou outro caminho mais terráqueo, um pouco vazio e cheio de vales sozinhos. Mas...o que haveria de ser mais real e significativo do que pisar na Lua? O que poderia ser mais concreto do que poder nos ver de uma perspectiva tão incerta?



          A Terra é azul.
    A Lua, continua.
    O homem é lunático.
   Meu sonho, não nego:
Foi belo!

2 comentários:

  1. ♪♫
    O astronauta ao menos
    Viu que a Terra é toda azul, amor
    Isso é bom saber
    Porque é bom morar no azul, amor

    Mas você, sei lá
    Você é uma mulher, sim
    Você é linda porque é

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